Sunday, September 23, 2007

O banco dos compadres

Foi a minha filha que o baptizou assim, ao banco. Já não sei o ano em que o meu tio, carpinteiro de sua antiga profissão, o construiu. Mas sei que foi para uma das festas de Sta Maria, perto de um 15 de Agosto. O assento é constituído por ripas de uma madeira tropical de boa qualidade. A estrutura, os pés, esses são de sólidos troncos de sobreiro, ainda cobertos de cortiça virgem. Se fosse preciso inventar um nome para o estilo desta peça de mobiliário poderia ser:
virgem..subero tropical ou coisa assim.....
Não sei o que acontece ao banco nos dias de inverno, se alguém o guarda e o protege das intempéries, da chuva, da geada. O frio intenso desvia-me daquela rota. De Verão, sim, o banco revive, renasce nas longas noites do escaldante verão alentejano. Antes e depois do jantar os compadres acorrem e ocupam os poucos lugares – 4 ou 5 que o banco oferece.
Como não chegam para a tertúlia que ali se promove, os mais retardatários e os mais novos, vão trazendo bancos ou cadeiras de campismo e vão-se reunindo à volta do dito.
Passa gente e mete conversa. Os apressados cumprimentam e vão à sua vida, ao Vitória beber um copo, jogar às cartas, os impacientes vão antes dar um giro pelo povoado, a ver se emagrecem, os ocupados vão lavar a loiça ou cumprir outra tarefa inadiável. Até que os primeiros anunciam – bom, são horas, vamos à deita.... e começa a desfazer-se a conversa e o enredo que ali nascem todas as noites... e o banco lá fica, impávido e sereno, único a gozar o fresquinho da noite.

Tuesday, September 18, 2007

Zarpar (de Lisboa)

Nunca soube porque partem os paquetes só ao final do dia...
Zarpam assim, direito ao mar, com o sol poente pela proa, transformando a despedida num ritual de fogo e luz, como se abandonar Lisboa a esta hora mágica fosse uma forma tímida de lhe prestar tributo.
Cruzo-me com eles muitas vezes, eu pela marginal, olhando-os de soslaio e a medo, não vá a sua beleza distrair-me da condução, eles a ignorarem-me sobranceiros, lá de longe, no meio do Tejo.
... fica tudo dito na luz da palavra zarpar, não se requerem mais demoradas explicações (embalar a trouxa e zarpar, dizia o Zeca...) .
Partir, ir à conquista, sair, nada é tão pleno como zarpar, soltar amarras e navegar. “Olha um paquete que zarpou” – e é um jorro de liberdade plena que se solta.
Também foi assim quando embarquei no velho Funchal, com destino aos Açores, numa data longínqua dos meus seis anos acabados de fazer. A sopa do jantar a balançar no prato, à saída da barra, o verdadeiro serviço de hotel a fazer o meu espanto nessa tarde em que avançávamos, passando a barra, mar repentinamente agitado, com o meu pai a dizer que era sempre assim, era normal...