Wednesday, November 08, 2006

Era uma vez uma história

Era uma vez uma história bilingue, com um trocadilho feito em duas línguas, contada primeiro dentro da minha cabeça, a duas línguas, recontada depois só numa… em verdade as duas línguas ficaram, também na minha cabeça, amigas quase irmãs, podendo facilmente, cá dentro, substituir-se e auxiliar-se uma à outra.

De facto a história nasceu a duas línguas com gente de dois países, lá bem longe, do outro lado da Europa, onde vivi dos melhores anos da minha vida…

Foi lida na rádio, por uma voz que se prestou primeiro a sentir as palavras alheias como se suas fossem e depois a dar-lhes luz e corpo, a fazê-las ecoar dentro de todos e cada um de nós.
Foi contada, recontada e agora mesmo impressa em livro, ali, as letrinhas bem alinhadinhas, preto no branco, como manda a lei …

Agora, do lado de lá, onde a história nasceu, pedem-me que a mande de volta às suas origens, que a traduza, embora algumas partes dela não careçam de tal, já são em búlgaro no original. Acho justo, afinal a história é mesmo bilingue, apenas o meu talento linguístico naquela língua continua a ser fraco, artigos definidos e ortografia deixando muito a desejar, vocabulário escasso… aqui é que era precisa uma mãozinha do Montanela e afinal desprezei-o.

Depois da história lida na rádio ainda procurei a outra das suas protagonistas, a que riu a bom rir no meio dela e que não mais encontrei. Procurei-a na casa onde sei que ainda mora, perguntei por ela no café mais próximo, que seguramente não frequenta, mas primeiro escrevi-lhe, uma breve carta com os meus contactos, para a morada que ainda tinha (a carta não me foi devolvida, o que significa que foi entregue, acredito nos correios). Soube dela, da minha colega de três anos de estudo, no tal café, deixei-lhe um recado pendurado na corda de estender a roupa e nada… nada veio de volta, nem um telefonema, um Olá como vais, nada mesmo nada. Assim resignei-me a voltar sozinha à nossa história, assumindo que a vou continuar a contar sozinha, que a vou lembrar sozinha, uma história de duas pessoas com uma ausência. Não me pesa, apenas estranho o quanto algumas pessoas não se deixam tocar nem pela própria vida que viveram. E espero continuar a estranhar, até ao fim dos meus dias.
Boa sorte, Maria!

4 Comments:

Blogger Elsa Gonçalves said...

A Maria ausente não sou eu, felizmente.

Lembrei-me de um projecto adiado, nosso, o de escrever estórias a 2 penas e de algumas folhas que guardo em lugar seguro, embora não lhes consiga já tirar o cheiro do mofo ...

A vida engole-nos às vezes como os dragões chineses, coloridos em dias de festa. E há quem passe por ela, indiferente às cores do dragão.

"Se puderes olhar vê, se puderes ver, repara" escreveu o controverso Saramago no seu brilhante ensaio sobre a cegueira.

E era uma vez...

November 15, 2006  
Blogger Alice said...

Sim, Maria da resposta, tu estás sempre presente ainda que o teu gravador de chamadas esteja ligado para fax e eu não tenha fax... estás a perceber o recado? vá lá telefona-me!
alice

November 19, 2006  
Blogger Kahlix said...

Pois não sei que te diga...
Apenas que todos nós temos as nossas "Marias", a quem deixámos recados nos varais da roupa, à espera de serem um dia recolhidos, dobrados, engomados e entregues de volta, para podermos ter o prazer de os encostar à cara e sentir o cheiro duma amizade lavada...

November 27, 2006  
Blogger Kahlix said...

Minha cara Alice
Obrigado pelos teus sempre amáveis e espirituosos comentários no meu humilde Blog...
E não te esqueças: O que não falta por esse mundo são varais para deixar bilhetinhos pendurados...

November 29, 2006  

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